Marcelo tem 18 anos, é natural de Porto Alegre-RS e se juntou à equipe de juniores do Náutico há onze dias para um período de testes como goleiro. O sonho de se firmar no clube foi interrompido bruscamente por um pesadelo na madrugada desta terça-feira. O rapaz denunciou, em entrevista ao Blog do Torcedor, ter sido agredido fisicamente e ameaçado de morte dentro do alojamento dos juvenis do Náutico, nos Aflitos, onde vinha dormindo. Ele escapou fugindo do clube, depois voltou com a polícia para pegar as suas malas, prometendo nunca mais voltar. O jogador ouviu dos companheiros que tudo não passaria de uma brincadeira. A hipótese mais forte é de que houve um trote com o novato. Um trote
Abaixo, o relato de Marcelo, em uma entrevista por telefone com duração de 40 minutos:
Eu estou lá no Náutico, eu cheguei aqui terça-feira passada. Cheguei em teste, para ficar 20 dias. Desde que comecei, me dava bem com todo mundo. E aí desde quando a gente começou a conversar, ouvi falar que uma vez uns caras da Fanáutico já entraram para roubar as coisas, quebravam tudo. Achei que era brincadeira, não era possível uma coisa chegar nesse ponto e não fazerem nada. Mas ontem aconteceu isso aí. Eu peguei um abacaxi na cozinha para comer. Estava na parte de cima da arquibancada, descascando. Eu sou dos juniores, mas estava no quarto do infantil e juvenil porque não tinha lugar no quarto dos juniores.
Depois de um tempo chegou um cara e disse para a gente entrar porque os caras da Fanáutico estavam lá. Quando eu passei pela escada, vi que tinha dois caras que eu não conhecia. Quando cheguei no quarto, tinha fechado a porta e continuei comendo o meu abacaxi, e daqui a pouco ouvi um barulho na porta e aí eu virei. Quando eu virei, foi muito rápido, um cara estava segurando alguma coisa, e foi gritando para eu virar a cara e ir para o chão. E aí eu escondi a faca que tava usando para descascar o abacaxi e virei para o chão.
Tinha muita gritaria e uns moleques abaixados no quarto. Tinha uns moleques ajoelhados. Quando eles entraram, eles me pegaram e me jogaram no chão. Estava escuro. Eu só via pela sombra, que entrava um pouco de luz pela brecha do quarto da frente. Quando eu tentava olhar, eles me dava um tapa na cara. Eles botaram alguma coisa na minha nuca e, como estava escuro, eu não sei o que era, mas parecia que era um revólver. Quando eles encostaram, era uma coisa redonda e um pouco gelada. Eu conseguia ver pela sombra que um outro estava com um ferro um pouco grande, quase no formato de uma foice. E tinha um outro que eu só conseguia ver o braço dele estendido em minha direção.
Um cara falou: "Por que tu já chegou tirando onda com a gente?" Ele deve ter falado isso porque eu tava com a faca na mão de descascar o abacaxi quando passei. Eu disse a eles que nunca falei nada, só ouvia a gritaria deles. "Todo mundo quieto, todo mundo quieto, não quero que dê problema para a gente. Se começar gritaria, vai ter tiro, vamos atirar". Eu tava no chão e tinha uns três na minha volta. Eu vi um tomando o telefone de outro moleque lá que tava numa cama mais próxima da porta que eles entraram.
Aí eles começaram a falar: "Que é que nós vamos fazer com ele?" Aí falaram que iam me levar para um banheiro. Falaram: "Vamos levar ele para o banheiro e vamos estourar ele no banheiro ou na piscina". E eu ouvi eles gritando e as pessoas disseram: "Faz isso com ele não, faz isso com ele não, é novato". E aí eu sentia que tavam colocando coisa na minha nuca. E eles disseram para todos ficarem quietos. E eles começaram a me puxar e a me carregar. Eu falei para não fazer nada, que se eles quisessem eu tinha coisa na mala para dar para eles. Disse que eu tinha roupa e dinheiro para levar. E aí eles começaram a falar: "Sujou, sujou, vigia!" E aí sairam correndo e acenderam a luz. Aí eu vi algumas pessoas reclamando que tinham dado na cara deles, não só em mim. Aí falaram "Se esconde! Se esconde! Eles vão voltar!".
Eu estava desesperado porque eu tinha sonhado uma coisa parecida um dia antes. E, se eu já sonhei com isso, eu pensei, não ia ficar esperando. E quando eu me escondi debaixo da cama eu vi que tinha uma outra porta do outro lado do quarto, que deixava escapar uma luz do lado de baixo do quarto. E eu pensei que tinha que sair do outro lado, pensei "Se eu ficar aqui eles vão me matar".
Abaixo, o relato de Marcelo, em uma entrevista por telefone com duração de 40 minutos:
Eu estou lá no Náutico, eu cheguei aqui terça-feira passada. Cheguei em teste, para ficar 20 dias. Desde que comecei, me dava bem com todo mundo. E aí desde quando a gente começou a conversar, ouvi falar que uma vez uns caras da Fanáutico já entraram para roubar as coisas, quebravam tudo. Achei que era brincadeira, não era possível uma coisa chegar nesse ponto e não fazerem nada. Mas ontem aconteceu isso aí. Eu peguei um abacaxi na cozinha para comer. Estava na parte de cima da arquibancada, descascando. Eu sou dos juniores, mas estava no quarto do infantil e juvenil porque não tinha lugar no quarto dos juniores.
Depois de um tempo chegou um cara e disse para a gente entrar porque os caras da Fanáutico estavam lá. Quando eu passei pela escada, vi que tinha dois caras que eu não conhecia. Quando cheguei no quarto, tinha fechado a porta e continuei comendo o meu abacaxi, e daqui a pouco ouvi um barulho na porta e aí eu virei. Quando eu virei, foi muito rápido, um cara estava segurando alguma coisa, e foi gritando para eu virar a cara e ir para o chão. E aí eu escondi a faca que tava usando para descascar o abacaxi e virei para o chão.
Tinha muita gritaria e uns moleques abaixados no quarto. Tinha uns moleques ajoelhados. Quando eles entraram, eles me pegaram e me jogaram no chão. Estava escuro. Eu só via pela sombra, que entrava um pouco de luz pela brecha do quarto da frente. Quando eu tentava olhar, eles me dava um tapa na cara. Eles botaram alguma coisa na minha nuca e, como estava escuro, eu não sei o que era, mas parecia que era um revólver. Quando eles encostaram, era uma coisa redonda e um pouco gelada. Eu conseguia ver pela sombra que um outro estava com um ferro um pouco grande, quase no formato de uma foice. E tinha um outro que eu só conseguia ver o braço dele estendido em minha direção.
Um cara falou: "Por que tu já chegou tirando onda com a gente?" Ele deve ter falado isso porque eu tava com a faca na mão de descascar o abacaxi quando passei. Eu disse a eles que nunca falei nada, só ouvia a gritaria deles. "Todo mundo quieto, todo mundo quieto, não quero que dê problema para a gente. Se começar gritaria, vai ter tiro, vamos atirar". Eu tava no chão e tinha uns três na minha volta. Eu vi um tomando o telefone de outro moleque lá que tava numa cama mais próxima da porta que eles entraram.
Aí eles começaram a falar: "Que é que nós vamos fazer com ele?" Aí falaram que iam me levar para um banheiro. Falaram: "Vamos levar ele para o banheiro e vamos estourar ele no banheiro ou na piscina". E eu ouvi eles gritando e as pessoas disseram: "Faz isso com ele não, faz isso com ele não, é novato". E aí eu sentia que tavam colocando coisa na minha nuca. E eles disseram para todos ficarem quietos. E eles começaram a me puxar e a me carregar. Eu falei para não fazer nada, que se eles quisessem eu tinha coisa na mala para dar para eles. Disse que eu tinha roupa e dinheiro para levar. E aí eles começaram a falar: "Sujou, sujou, vigia!" E aí sairam correndo e acenderam a luz. Aí eu vi algumas pessoas reclamando que tinham dado na cara deles, não só em mim. Aí falaram "Se esconde! Se esconde! Eles vão voltar!".
Eu estava desesperado porque eu tinha sonhado uma coisa parecida um dia antes. E, se eu já sonhei com isso, eu pensei, não ia ficar esperando. E quando eu me escondi debaixo da cama eu vi que tinha uma outra porta do outro lado do quarto, que deixava escapar uma luz do lado de baixo do quarto. E eu pensei que tinha que sair do outro lado, pensei "Se eu ficar aqui eles vão me matar".
Quando eu ouvi um barulho na porta da frente eu chutei a porta dos fundos e saí por ela. E a arquibancada, o quarto da gente, é um pouquinho alto, como se fosse o primeiro andar de um prédio. E foi a única saída que eu tinha. E aí eu caí, machuquei os dois pés, pensei que tinha quebrado, saí mancando, doeu muito, pensei que tinha quebrado o pé. Eu saí no meio da rua tentando parar os carros, mancando muito, pedi ajuda. Fui andando pela avenida (Rosa e Silva) na contramão, entrei no Bompreço e ninguém me ajudou. Aí entrei na rua do Bompreço (Conselheiro Portela), fui nos prédios e ninguém queria me ajudar. Então cheguei num posto perto, com dois taxistas, um dos taxistas me atendeu.
No fim das contas eu tomei uns dois tapas na cara e um chute. Fui agredido, mas não ficou nenhuma marca. Só meu pé tá muito inchado, todos os dois, e roxos, mas foi do pulo e não da agressão. E ameaçaram me matar.
Depois eu voltei com a polícia lá. Não tinha ninguém do clube lá. Só o porteiro. Quando eu cheguei lá, falei para os jogadores, e falaram que era uma brincadeira. Eu vi muita gente dizendo que era trote, que era brincadeira. Me disseram que todo mundo passa por isso. Com todos foi assim. E outras pessoas dizendo que era para fazer alguma coisa. Estava todo mundo um pouco nervoso. O primeiro cara que entrou, eu não conhecia ele. Eu conheço os jogadores e não era um deles. Eu conhecia os caras. Como estava muita gente falando, eu via nervosismo. Os outros disseram para fazer alguma coisa, para a galera ir embora.
Se foi trote, se foi brincadeira, provavelmente eles arrumaram alguém desconhecidos. Se não foi trote, foi isso aí, foi sério. Foi muito realista. Não parecia brincadeira. Mas quando eu voltei lá parecia estar uma coisa mais calma, mas, mesmo assim, foi um troço bem realista. Todo mundo disse que era brincadeira. Outros disseram que era para não criar problemas para eles se não os caras que entraram no quarto iriam voltar e ia ser pior ainda.
No aperreio eu só pedi para o pessoal esperar eu pegar a minha mala para sair. O policial saiu e eu fiquei esperando na frente do Náutico até meu tio chegar. Eu tenho um primo que mora aqui perto, eu consegui a falar com o meu primo e fui para a casa dele.
No aperreio eu só pedi para o pessoal esperar eu pegar a minha mala para sair. O policial saiu e eu fiquei esperando na frente do Náutico até meu tio chegar. Eu tenho um primo que mora aqui perto, eu consegui a falar com o meu primo e fui para a casa dele.
É uma coisa muito grande. E se não foi trote, falta segurança, falta muita. Se aconteceu isso, um dia ou outro vai aparecer alguém morto lá. E outra coisa, eu tava com uma faca na mão, e eu poderia ter reagido. Falta disciplina, regra, maturidade, isso é uma palhaçada. Não tem regra nenhuma naquela m*** lá. Nada, nada. Ninguém para acompanhar nada.
Eu estou muito indignado, até porque estava no meio de um teste, mas agora não vou continuar. Eu não consigo nem andar sem ajuda de outra pessoa. Eu só consigo andar quando alguém vem me ajudar de lado.
Eu estava adorando ficar lá no Náutico, apesar das condições ruins do alojamento. No meio do quarto tinha lama, era imundo. O ralo do banheiro era entupido, tinha muito mosquito, tava criando umas minhoquinhas no chão. Apesar disso, eu já estava me sentindo em casa. Me deram essa chance. Todos os funcionários me trataram muito bem, eu me senti em casa. Os funcionários, desde a comissão técnica até os que trabalham mais na cozinha, foram ótimos. Gostei muito deles. Eu fui lá com a cabeça no futebol. Essas coisas do alojamento ser terrível não atrapalharam em nada.
Mas depois disso não tem mais como o cara jogar bola lá. Porque eu estou com os dois pés machucados. E eu não quero mais voltar para lá de jeito nenhum. E só falto ir na polícia para fazer a ocorrência. Depois vou embora para Maceió, onde tenho mais tios, e então voltarei para Porto Alegre.
Náutico vai apurar o ocorrido
O diretor do departamento de juniores do Náutico, Chico Accioly, confirmou ter recebido uma informação a respeito de um problema que aconteceu no alojamento e assegurou que tudo será apurado em uma reunião na manhã deste sábado, às 8h, nos Aflitos. Accioly disse ter colhido até o momento informações de que houve "um trote, uma brincadeira maliciosa", segundo os jogadores dos juniores. Ele antecipa que, mesmo se for brincadeira, o clube não admite esse tipo de conduta relatada por Marcelo e deve punir os responsáveis.
Disse Chico Accioly:
Amanhã, às 8h, teremos numa reunião com os jogadores e os supervisores para apurar o que houve. Ainda não podemos informar se houve isso ou aquilo. Vamos apurar o que aconteceu. Se foi realmente isso que ele relatou é descobrir quem foi o autor dessa brincadeira e puni-los. Se até for jogador profissional, também terá multa e até quem sabre rescisão. A gente não está formando jogadores para ter isso não. Pelo contrário, estamos buscando formar cidadãos, buscamos inclusive oferecer faculdade para os juniores. Se houve qualquer brincadeira em excesso, vai haver uma punição.
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