segunda-feira, 6 de fevereiro de 2012

Homem perde emprego por ser viciado em sexo.

   Ricardo, engenheiro carioca de 41 anos, passou grande parte de seus anos de faculdade na noite. Saía desde terça-feira e se achava um garanhão: fazia sucesso com as amigas dos amigos. Quando não havia mais a quem ser apresentado, Ricardo passou a dedicar cada vez mais tempo a encontrar novas parceiras. Os amigos, as conversas e mesmo os estudos foram ficando para trás. A qualquer lugar que ia, sua preocupação era encontrar mulheres. A urgência era tão grande que um dia foi pego por um policial fazendo sexo com uma mulher dentro do carro, na Lagoa Rodrigo de Freitas. Por pouco não foi parar na delegacia. Desconfiou que tinha um problema quando a fixação no sexo o levou a trancar a faculdade.  

Mário, um profissional de saúde paranaense de 40 anos, tinha um bom relacionamento com a mulher, mas sempre se sentiu atraído por homens. Nunca transformara o desejo em prática, até que, num bate-papo on-line, marcou encontro com um desconhecido. Depois do primeiro, seguiram-se vários nos dois anos seguintes. Em uma semana, foram oito. Mário nem sabia seus nomes. Envergonhava-se daquele comportamento e o escondia. Um dia, descuidou-se. Deixou o programa de chat aberto no computador. A mulher descobriu e, arrasada, pediu a separação. Depois do divórcio, Mário entrou em depressão, começou a beber e, com medo de se tornar dependente de álcool, decidiu buscar ajuda. Descobriu no Alcoólicos Anônimos que seu problema não era a bebida, mas o sexo.
• Hugo, um corretor de seguros de 40 anos, de Fortaleza, tentou três vezes seduzir a própria sogra. Colocou a culpa na bebida, mas era só a fantasia crescendo. Quando ia para a praia, tinha de se masturbar no mar e, mesmo casado, tinha relações com várias mulheres, prostitutas entre elas. Chegou a pagar passagem de avião e hospedagem para uma delas visitá-lo. Um dia, voltando de uma festa em que não tinha ficado com ninguém, decidiu passar pela Avenida Beira-Mar, ponto de programas. Com o cartão de crédito estourado e sem dinheiro no banco, foi parar na casa de uma prostituta na favela e pagou com um tíquete-refeição. Nesse momento, percebeu que sua relação com o sexo não era como a de seus amigos. 
• Caio, um produtor musical de 48 anos, de São Paulo, viu sua vida sexual com a mulher murchar depois do nascimento da primeira filha. Na mesma época, suas viagens a trabalho se intensificaram. Longe de casa, num ambiente de festas, drogas e sexo, começou a ter aventuras. Durante a semana, voltava para a família e se acalmava. Mas a ansiedade por novos encontros aumentou, e Caio chegou a se hospedar sozinho num hotel em São Paulo em busca de mulheres. Numa das viagens de trabalho, numa festa, bebeu um pouco a mais e acabou ficando com um homem, mesmo sem nunca ter tido experiências homossexuais. Sua mulher desconfiou quando descobriu uma doença venérea.

• Cátia, uma economista de 54 anos que mora no Rio de Janeiro, não teve muitos parceiros. Mas sua vida era tragada pelo sexo dentro dos relacionamentos. Passou uma semana trancada no quarto, deixando para trás o trabalho num órgão público e o cuidado com as duas filhas. A necessidade de sexo se sobrepunha até às orientações médicas de parar de transar durante tratamentos ginecológicos. Depois de várias relações intensas e destrutivas, Cátia perdeu o controle sobre o próprio desejo. Com o fim do último relacionamento, passou a se masturbar dirigindo e também no ambiente de trabalho.

Dependência de sexo, comportamento sexual compulsivo e transtorno hipersexual. Há dúvidas sobre como classificar o distúrbio de Ricardo, Mário, Hugo, Caio e Cátia (os nomes são falsos), que acabaram buscando ajuda médica ou psicológica. O debate sobre o que os aflige acontece há mais de um século. A primeira referência vem do psiquiatra alemão Richard von Krafft-Ebing, em seu livro Psicopatias sexuais, de 1886. Na obra, ele tenta categorizar o que chama de “desvios sexuais”. Discute a homossexualidade, o sadismo, o fetichismo e o que antigamente se chamava de ninfomania, o excesso feminino de sexo. Muitos dos comportamentos que Krafft-Ebing descreveu deixaram de ser considerados patológicos ao longo dos anos, das mudanças sociais e do avanço das pesquisas. O caso mais notório é a homossexualidade.

Mas o “desejo sexual excessivo” entrou para o rol do Código Internacional de Doenças, publicado pela Organização Mundial da Saúde. A quarta edição do Manual estatístico de doenças mentais (DSM, na sigla em inglês), a referência dos diagnósticos psiquiátricos, não tem uma categoria própria para o problema. Cita o comportamento sexual excessivo entre os “transtornos sexuais não especificados”. A próxima edição do DSM, prevista para 2013, deverá incluir uma menção a “transtorno hipersexual”.

É pouco provável, porém, que a nova classificação encerre o debate. Por dois motivos. Primeiro, porque sempre foi e será difícil estabelecer os parâmetros de normalidade do comportamento sexual humano. Não existe um limite ideal para o número de orgasmos ou para o tempo gasto com fantasias ou relações sexuais. Segundo, porque a quantidade de sexo, como sugere o termo “hipersexualidade”, não é o fator decisivo para o diagnóstico. “A dependência sexual não tem a ver com a intensidade da atividade sexual. Nem com sua frequência”, disse a ÉPOCA o psicólogo americano Patrick Carnes, fundador do International Institute for Trauma and Addiction

Professionals e um dos pioneiros do estudo da dependência sexual. “A principal marca do vício são as consequências que alguém sofre por causa de sua atividade sexual.” Se a pessoa perde o emprego, para de estudar ou se afasta da família por causa do sexo, é sinal de que há algo errado. “Quando alguém passa todo o tempo pensando em sexo, planejando, fazendo e se arrependendo, em vez de trabalhar, curtir a família, os amigos e outras atividades prazerosas, é um problema”, afirma Carnes.

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