Uma vacina brasileira contra o vírus HIV será testada em macacos a partir de
setembro. O imunizante, que começou a ser desenvolvido em 2001, conseguiu bons
resultados nas avaliações feitas em camundongos. “Nos camundongos nós tivemos
uma resposta muito forte, muito intensa, que agora a gente vai desafiar para
saber se essa resposta é forte assim nos macacos”, explicou um dos responsáveis
pelo projeto, o pesquisador da Faculdade de Medicina da Universidade de São
Paulo (FMUSP), Edecio Cunha Neto.
O estudo está sendo conduzido pelo Instituto de Investigação em Imunologia,
vinculado ao Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação (MCTI) e apoiado pela
Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp). Os trabalhos
também são conduzidos pelos pesquisadores da FMUSP Jorge Kalil e Simone
Fonseca.
A nova fase de testes é decisiva, uma vez que os macacos têm o sistema
imunológico muito mais próximo do humano do que os camundongos. “Se no macaco
nós tivermos uma resposta da força que nós tivemos no camundongo, nós temos um
candidato à vacina muito poderoso”, diz Cunha. Nesta fase, a vacina será
ministrada a quatro animais e os pesquisadores precisarão de ao menos seis meses
para começar a avaliar os resultados.
O vírus causador da aids tem uma série de características que dificultam a
criação de uma vacina, apesar das intensas pesquisas desenvolvidas em todo o
mundo para isso. Uma delas é a grande variação do genoma nas diversas variedades
do vírus. Segundo Cunha, essa diferença pode chegar a 20%. “Para nós
contornarmos isso, nós selecionamos 'regiões' do HIV que eram muito conservadas,
que não mudavam de um vírus para o outro”, explicou.
Os pesquisadores tiveram que identificar dentre esse material genético que
não variava os elementos que são reconhecidos pelo sistema imunológico da maior
parte da população. “Nós conseguimos fazer isso com auxilio de programas de
computador e testes químicos e biológicos”, disse o pesquisador, explicando o
processo de elaboração da vacina.
A partir daí, foi desenvolvido um imunizante que aumenta a resposta do corpo
à ação do HIV, atenuando os efeitos da doença. “Essa vacina não é capaz de
bloquear ou neutralizar os vírus totalmente. Ela é capaz de atenuar a infecção,
reduz a quantidade de vírus que vai replicar”, diz Cunha. Com isso, a pessoa
infectada teria menos sintomas da doença e uma capacidade muito menor de
contaminar outras pessoas. “Isso ia significar, ao longo do tempo, a diminuição
de centenas de milhares ou milhões de casos novos de HIV na população”.
De acordo com o pesquisador, com a tecnologia atual, esse é o único modelo
viável de imunização. A vacina que bloqueia completamente a ação do vírus “nem
em modelo animal tem obtido sucesso”.
Após o teste com o primeiro grupo de macacos, a vacina passará por uma nova
fase de testes, também em símios, com uma amostragem maior. “Vai ter pequenas
variações na vacina e vai ter vários grupos de quatro animais cada um para ver
qual variação que tem a resposta mais forte”, detalha Cunha. A partir daí será
possível passar para os testes em humanos.
O pesquisador ressalta, no entanto, que a avaliação de eficácia em larga
escala dependerá de “uma decisão política” para o desenvolvimento dessa
tecnologia no Brasil, devido aos custos envolvidos. Seriam 10 mil pessoas
avaliadas por cinco anos, com um investimento que varia de R$ 100 milhões a R$
200 milhões. “ Não é um recurso que um fundo de pesquisa vai financiar”,
enfatiza. Até agora foram investidos, segundo Cunha, R$ 1 milhão no projeto. Os
testes em macacos deverão demandar mais R$ 2 milhões, segundo a estimativa do
especialista.
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